Sunday, August 9, 2009

Estratégia : 10 tendências a monitorar

Foi publicado um artigo na edição de julho/2009 da revista Harvard Business Review um artigo - de autoria de Eric Beinhocker, Ian Davis e Lenny Mendonça - que apresenta 10 tendências a serem monitoradas por qualquer estrategista de plantão. Esse artigo é baseado nas forças subjacentes que ajudam a moldar o ambiente de negócios e buscar sinais de descontinuidade que são monitoradas pela McKinsey & Company que vão desde o crescimento em mercados emergentes à evolução do papel da empresa na sociedade. Avaliando esses fatores, os autores argumentam que, após a crise, o ambiente de negócios sofreu transformações e não voltará a ser o que era antes da crise.

Meu objetivo com esse post é relacionar essas 10 tendências, colocar a minha opinião sobre cada uma delas e provocar um debate sobre elas. Não é minha intenção colocar o conteúdo do artigo aqui até por respeito a publicação da revista. Portanto, se vocês querem mais detalhes sobre cada uma das tendências relacionadas no artigo, procurem a revista na banca e compre-a.

Vamos as tendências:

- Recursos sob pressão: Lembro-me de uma palestra que assisti do professor Vicente Falconi, cujo título era “A invasão dos bárbaros e as decisões empresariais de hoje”, em que o professor acredita que estamos diante de uma aceleração muito grande na economia e que coisas que serão decisivas daqui a 10 anos, mas que precisavam começar a ser preparadas hoje. Falconi apresentou o conceito histórico da palavra “bárbaros” como sendo todo aquele que não pertencia ao império romano, ou seja, eram povos pobres, nômades e pessoas com muita fome. Esses povos bárbaros eram motivados pela guerra para matar a sua fome. Fazendo um paralelo com os dias atuais, Falconi argumenta que a história se repete de formas diferentes, ou seja, o império romano mudou de mãos(países desenvolvidos ou primeiro mundo) e os bárbaros são os países excluídos desse império (países emergentes ou do terceiro mundo). Os países do novo império reunem cerca de 1 bilhão de pessoas, enquanto que os países “bárbaros” reunem em torno de 5 a 6 bilhões de pessoas. Muitos desses países “bárbaros” possuem economias em franco crescimento e farão parte do “novo império”, o que caracteriza, segundo o professor Falconi, a invasão dos ”novos bárbaros”. Esses bárbaros estão consumindo mais e a consequência disso é o aumento do consumo de recursos como combustível e água, o que naturalmente exerce uma pressão sobre os preços dessas comodities. Portanto, devemos nos preparar para um mundo em que haverá o encarecimento desses recursos como, por exemplo, os recursos minerais e hídricos;

- Globalização sob ataque: Essa é uma tendência que deve ser analisada em partes. Com relação ao comércio mundial, acredito que haverá uma retração, mais em decorrência da crise financeira e da insegurança do consumidor que ela gerou, mas deve ser retomada com a recuperação da economia. Um revés na globalização do comércio traria consequências muito grandes para o consumidor como consequência da diminuição da competitividade entre os mercados. Já a globalização financeira porque foi justamente a complexa conexão entre os mercados financeiros que envolveu vários países é que gerou o efeito cascata que afetou todos os países durante a crise financeira mundial. A consequência desse efeito é que aumentarão os mecanismos reguladores para evitar atividades de especulação financeira e o aumento de incentivos para investimentos em atividades produtivas, que passem a gerar riquezas através da produção e não a partir de engenharia financeira; More »« Less

- Confiança em empresas se esvai: Lembro-me de uma palestra do professor Michael Porter sobre responsabilidade socio-ambiental em que ele argumentava que a empresa deve realizar essa responsabilidade olhando para sua cadeia de produção e identificar atividades em que ela pode exerce-la. No caso dos bancos, por exemplo, seria não conceder empréstimos a empresas que exploram mão de obra infantil ou escrava. Dessa forma, as empresas começariam a resgatar a confiança da sociedade. Caso tal ação não fosse adotada pela empresa, o consumidor perderia a confiança na empresa e haveria desvalorização da marca. Outro aspecto a ser considerado é com relação a atração de talentos para trabalhar na empresa. Vale lembrar aqui um dos 25 desafios de gestão apresentados pelo professor Gary Hammel para construção da Gestão 2.0 que coloca como essencial garantir que o trabalho da gestão sirva a um propósito maior, uma vez que o foco no atendimento das expectativas do acionista não tem o poder de mobilizar plenamente a energia humana, ou seja, as práticas de gestão empresarial devem ser voltadas a metas mais nobres, socialmente relevantes;

Um papel maior para estado: Diante da crise financeira mundial, os governos tiveram que ter uma atuação muito forte para resgatar a confiança no mercado financeiro e para isso tiveram que liberar muitos recursos para socorrer o sistema financeiro. Ocorre que toda essa ação foi necessária devido a ausência do governo em alguns países na regulação do mercado financeiro. A consequência disso é um aumento da importância do estado enquanto regulador das atividades financeiras e estimulador de investimentos em atividades produtivas o que inibirá inovações no mercado financeiro, mas incentivará a inovação em atividades produtivas;

- Administração como ciência: Essa é uma tendência que eu discordo. Segundo os autores, dados, capacidades de processamento de computadores e modelos matemáticos estão transformando muitas áreas da gestão de arte em ciência. Na minha opinião, trabalhar apenas com o lado racional para a tomada de decisões é um equívoco muito grande, pois a maioria dos movimentos no ambiente de negócio depende muito do comportamento humano dentro desse cenário e isso dificilmente será possível de mapear em modelos matemáticos, por mais avançadas que essas técnicas sejam. Entendo que haverá um maior uso da racionalidade nas decisões estratégicas, mas nunca será excluído do processo a intuição de um gestor, além de não considerar os aspectos humanos e emocionais do ambiente de negócio, o que exige habilidades de arte para executar o processo de decisão dentro da empresa. Se fosse dessa maneira, não precisaríasmo de líderes e nem de planejamento, bastava jogar tudo em uma máquina e seguir o que ela estabelecer. Nesse caso, todas as empresas fariam sempre a mesma coisa, uma vez que essa “máquina administrativa” seria adotada por todos;

- Novos padrões de consumo: Essa tendência tem muita relação com a invasão dos “bárbaros” citado pelo professor Falconi na sua palestra. Esses “novos bárbaros” possuem necessidades e culturas diferentes de consumo. Se levarmos em consideração que dos 4 países que formam o BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) veremos que três dos quatro países estão na Ásia, o que muda o eixo do consumo dos Estados Unidos para o continente asiático. Outro fator a ser considerado é o aumento da longevidade humana que leva ao aumento da população idosa no mundo. Portanto, a oferta de produtos para consumo terão que levar em consideração esses aspectos;

- Ascensão da Ásia: Como escrevi na tendência imediatamente anterior, três dos quatro países do chamado BRIC estão no continente asiático. Para se ter uma idéia dessa mudança em relação ao Brasil, lembro-me de uma palestra do articulista Stephen Kanitz em um congresso em que ele apresentou o mapa mundi e perguntou sobre a localização do Brasil e da Nova zelândia. Todos responderam que o Brasil está mais próximo do centro do mundo, enquanto que a Nova Zelândia estava no final do mundo. Depois disso, ele mudou a forma como o Mapa mundi é apresentado e colocou a China como o centro do mundo(faça esse exercício você em casa). Diante disso, a Nova Zelândia passa a estar mais próxima do centro do mundo, enquanto que o Brasil passa a estar no fim do mundo. Nesse caso, o Brasil passaria a ter desvantagem na sua estratégia de competitividade no mercado exterior devido a maiores gastos com processos de logística, por exemplo;

- Setores de cara nova: Já escrevi aqui no blog sobre isso. Há uma tendência muito forte de consolidação em alguns setores devido a estratégia de aquisições e fusões. Isso ocorre notadamente no mercado bancário e de tecnologia da informação. Tal consolidação pode afetar a relação de forças competitivas se lembrarmos o modelo das cinco forças competitivas do professor Michael Porter, uma vez que, com a consolidação desses mercados, o poder de negociação desse fornecedores aumentaria consideravelmente;

- Inovação segue em frente: Essa é uma tendência mais do que óbvia. No cenário atual, assumirá maior vantagem competitiva quem perceber mais cedo quando haverá a recuperação da economia e começar a investir em inovação antes do início dessa recuperação. Como disse o professor Falconi “Temos que pensar que decisões temos que tomar agora para as transformações que virão daqui a alguns anos”. Empresas que mantiveram seus investimentos na geração de inovações estarão mais preparadas quando houver a retomada do crescimento da economia mundial;

- Estabilidade de preços em dúvida: Essa é uma tendência sobre a qual eu não tenho uma opinião formada. Segundo os autores, a ameaça imediata é de deflação, com o excesso de capacidade de produção fazendo considerável pressão para a queda dos preços de toda sorte de produtos, de alimentos in natura a material de construção. Ocorre que devido as iniciativas do poder público para conter a crise e turbinar o crescimento econômico fizeram surgir a possilibidade de volta da inflação. Quando o crescimento econômico voltar, bancos centrais terão de conter as forças inflacionárias sem inibir a recuperação - equilíbrio delicado que será dificultado ainda mais pela alta dos preços das comodities;

Como podemos perceber, o mundo dificilmente será o mesmo que antes da crise. Aliás, essa crise é na verdade uma vingança da nova economia em relação a velha economia, ou seja, o estouro da bolha financeira foi na verdade o estouro da bolha da era industrial. Como disse Peter Senge, no último fórum mundial de liderança organizado pela HSM, a crise representa um momento singular, uma oportunidade para que as empresas e pessoas repensem os conceitos e as premissas que as impedem de ver o quadro real. O quadro a ser construído deve ter como alicerce o desenvolvimento sustentável da nova economia e não o modelo exploratório da velha economia.

"Não vivemos em uma época de mudança, mas sim em uma mudança de época". Por Marcelão/ UoD HSM

“Keep the faith”

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